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Quem Somos Nós
A rua é um espaço múltiplo onde a coletividade expressa sua potência e pessoas das mais distintas realidades e origens estão expostas ao encontro fortuito. Ali celebrações populares acontecem. Manifestações políticas, religiosas, laborais e artísticas nascem e se desenvolvem. A rua representa a fusão do mundo ordinário, cotidiano, corriqueiro e das manifestações extraordinárias, imponderáveis. Escolher agir nesse espaço de resistência- eminentemente feito de memórias, de fluxos e presenças distintas -, é o fio condutor do Festival Marco Zero desde sua criação há quase 20 anos.
O projeto do FMZ mescla os temas Dança-Arquitetura-Transeunte-Brasília, tombada pelo Governo Federal e pela UNESCO como Patrimônio Cultural da Humanidade. Em todas as edições - que ocorreram nos anos de 2006 (1ª), 2009 (2ª), 2010 (3º), 2017 (4º), 2022 (5º), 2023 (6º) e 2024 (7º) - as intervenções ocupam os espaços públicos e as paisagens urbanas da capital, temporariamente povoadas por movências artísticas que tocam, direta ou indiretamente, no tema da coletividade, sua produção, agentes e políticas inclusivas.
Compreendendo a rua como lugar de sinergia e conflitos entre potências estéticas de diferentes culturas, a equipe curatorial, composta por quatro mulheres artistas – que pesquisam a dança e as artes da cena há mais de 20 anos -sempre busca dedicar especial atenção a produções pretas, indígenas, LGBTQIAPN+ e de pessoas com deficiência.
Todas as edições do FMZ tiveram programação gratuita, nas ruas do plano piloto e periferias tendo como público-alvo os transeuntes, trabalhadores e as populações de rua.
Com a palavra,
as curadoras
PALCO HORIZONTAL
por Marcelle Lago, mulher PCD, idealizadora e curadora do FMZ
Pulsação, movimento genuíno e pertencimento!!! Nosso palco é horizontal, democrático, cheio do nosso público – os transeuntes. Realizar um festival de dança todo nas ruas do DF é dizer não a higienização dos centros culturais!! Curamos também onde queremos estar. E nosso lugar é na rua.
MARCOZERO E A RUA
por Ivana Motta, mulher preta e curadora do FMZ
Poéticas e políticas das artes que se pensam desde a rua, com a rua, para a rua guiam o Festival Marco Zero, uma iniciativa que já nasceu se amostrando, se expondo ao encontro regado de incertezas, desafios, prazeres e provocações que moram nos espaços de fluxos e presenças diversas. Escolher agir com este componente-rua é o que de fato demarca a singularidade deste festival no território do DF e assenta uma sinergia com os fazeres das celebrações e festas pretas e populares. Sempre foi na rua que estas coletividades derramaram suas potências criativas, estéticas, simbólicas, celebrativas, fomentando neste lugar-rua uma força de pulsão de vida e encantaria. Na rua se arreia o alguidar da oferenda. A rua é morada dos encantados, das encantadas, das forças de uma poética sagrada afro-indigena presente nas caboclarias, nas pombagiras, exus. É na rua que pulsam os sambas, frevos, maracatus, caboclinhos, as batalhas de break, os slams, cocos... A rua, com sua existência indisciplinar, convida ao exercício de ser/ estar em co-movências, compreendendo modos dinâmicos de uma organização própria. No Festival Marco Zero, é da inteireza da experiência nos espaços rueiros que os afetos surgem e conduzem os modos de relacionar arte, rua e transeunte. Os encontros não programados ou disciplinados por uma lógica dada pela função dos espaços, abrem a possibilidade do encanto fazendo do território do DF um chão possível e fértil para semeaduras poéticas. A rua como plataforma de fazer artístico é simultaneamente lugar político de projeção de questões urgentes em nossa sociedade, lugar de agenciar pela imagem, pelo simbólico, pelo sensível um outro programa ético-relacional que nos permita ser/estar em um mundo menos adoecedor e violento. Olhar para agendas populares, das coletividades indígenas, negras, femininas, LGBTQUIAPN+, das pessoas com deficiências, entre outras, é parte do modo como este festival movimenta suas narrativas e suas curadorias, desde as edições iniciais. Festival Marco Zero tem compreensão coletiva das realidades que se apresentam, na percepção ampliada da composição de uma programação, na implicação das existências/experiências das curadoras, nas escutas, no exercício político de perceber presenças e ausências históricas que pudemos movimentar a curadoria em direções de (re)invenções, (re)fazimentos, Não se trata de inventar a roda, mas de perceber que ela pode girar no sentido anti horário e, assim como um xirê, abrir o campo dos tempos espiralares pra assentarmos encontros reais, movimentados pelo visível e invisível.
TODA RUA JÁ FOI FLORESTA
por Barbara Mathias, mulher indígena e curadora do FMZ
Vivenciar a experiência de vários corpos dançando em tempos diferentes, em ruas diversas de um lugar que é marcado pelo símbolo do formal, do terno, da política das leis, do lugar onde assinam documentos que determinam o futuro do resto do país. É assim, que do interior do Ceará no auge dos meus trinta anos enxergava Brasília. Tem um ditado popular que diz: quem faz o lugar são as pessoas. E as pessoas que fazem Brasília são pessoas para além das que estão no Congresso, ainda que no congresso encontramos alguns de nós. Eu sou Barbara Matias, sou indígena do Povo Kariri e essa foi a minha primeira curadoria e talvez, o Marco Zero seja o primeiro festival de artes da Cena do Brasil com uma curadora indígena, gerindo narrativas, escolhendo discursos a serem pautados. Os corpos ausentados historicamente insistindo em acontecer, em coletivo. Reflorestando memórias através do nosso pisar na rua. Nossa musculatura carrega milhares de anos de (sobre) vivência, com ela, sem dúvidas o que mais fizemos foi dançar - quando o movimentar-se, narrar -se no mundo por meio do gesto não era codificado como linguagem artística e sim, expressão de vida. Necessidade intuitiva de conversar com bichos, árvores e gente. A rua é o maior Arquipélago dos sonhos. É onde a vida se regenera a céu aberto. É o lugar com todo tipo de gente, de história - de movência. A rua é antes de qualquer coisa, um lugar que já foi floresta, já foi mata, já teve onça, jibóia e veredas, muitas. Quando pisamos na rua estamos pronunciando o desejo de segredar com os ancestrais, pelo pé, mão, pelo olhar que fareja o mundo. O festival Marco Zero 2023 escolheu fazer isso com artista que tem ligação com as memórias da luta pela terra, aqueles que fazem luta política/resistência enquanto fazem o que chamamos de arte. Nosso desejo é alongar a musculatura para ativar essas arqueologias-vivas de uma memória que dança para a lua, para o sol, para a pessoa em situação de rua, para o político que passa na avenida em seu carro importado, para a criança indígena, preta, para a criança LGBTQIAPN+. Dançar para perguntar e dançar quando ainda não se entende a resposta. Dançar pelo desejo de deslocar-se das dores, para expor as dores e dançar para plantar sonhos.
EIXOS DA CURADORIA
por Flavia Meireles, mulher lésbica e Curadora do FMZ
A curadoria do Festival Marco Zero tem como ponto de partida os seguintes ajuntamentos temáticos: 1. Corpo político - intervenções e propostas que endereçam política tanto na sua temática como nos seus modos de operar e intervir; Corpo afrodescendentes, corpo indígena, corpo e descolonização. 2. Corpo próprio - propostas que investiguem os limiares entre o corpo individual e social, corpo próprio e coletivo, enfatizando as discussões sobre protagonismo e autodeterminação corporal; corpos, LGBTQUIAPN+, a relação com o urbano, espacialidade, movimento. 3. Corpo do futuro - direcionada a sensibilizar o público infantil acerca da vivência do corpo em espaços públicos, como os espaços bucólicos de Brasília e da periferia se relacionam com o brincar. Dentro dos ajuntamentos, já citados, nos interessam em particular as temáticas: Descolonização dos corpos e movimentos, a relação deles com a cidade, assim como, as diversidades sociais - LGBTQUIAPN+, afrodescendentes, indígenas, temática feminina, a questão do assédio e a observância (ou não) da lei do silêncio, ponto polêmico na cidade de Brasília - abrindo espaço também a propostas que tratem do sonoro. O objetivo do Festival é discutir cidade a partir das questões que dela emergem por meio de formulações artísticas. Sustentando a perspectiva de que o espaço arquitetônico favorece certas relações e inibe outras, o modo como os artistas interferem, modificam e criam o espaço urbano pode suscitar vivências imprevisíveis ou dar visibilidade a aspectos latentes, porém sensíveis, da vida urbana. Discutir cidade a partir das questões que dela emergem por meio de formulações artísticas.
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